segunda-feira, 22 de junho de 2015

A jornalista mineira Clara Arreguy atravessa o País Basco de bicicleta ao percorrer o Caminho de Santiago


A jornalista mineira de ascendência basca, Clara Arreguy, percorreu de bicicleta o tradicional caminho de peregrinação cristã do apóstolo Sant´iago. Partindo da cidade basca  de Donibane Garazi (no Iparralde, extremo norte do país), Clara atravessou os Pirineus e algumas das províncias do sul  (Hegoalde) antes de seguir viagem até a Santiago de Compostela, na Galiza. Abaixo o relato de Clara e o convite para o lançamento do seu livro "Siga as setas amarelas" onde a autora detalha esta aventura sobre duas rodas pelas estradas da peninsula ibérica.



Quem tem um sobrenome como o meu já se acostumou à pergunta:
- Arreguy? É o quê? Francês?
E à resposta:
- Não. Basco. Mas da região francesa do País Basco. Bayonne. Por isso a oxítona. Na Espanha, é Arregui, paroxítona.
Até a adolescência, isso era tudo que sabia sobre o nome que chamava tanta atenção. Até que a curiosidade que me levaria à profissão de jornalista conduzisse a uma investigação mais detida. E às informações possíveis: minha mãe era filha de João Etienne Arreguy, que tinha o mesmo nome do pai. O avô de João foi o primeiro Arreguy a chegar ao Brasil. Joseph. Casou-se com uma alemã chamada Catarina Schuler. Desse primeiro casal nasceu todo o nosso clã familiar.

O tempo me apresentou mais detalhes. Dizem que Catarina tinha duas irmãs, que também se casaram com imigrantes e que geraram a descendência dos Vermelho e dos Gusman, que virariam Gusmão – todos em Muriaé, terra onde Joseph e Catarina se instalaram. Dessa forma, Arreguys, Vermelhos e Gusmans seriam todos primos por parte das irmãs Schuler. Ou senão por algo mais picante: Joseph teria namorado as três alemãzinhas... Sabe-se lá a veracidade da fofoca.

De qualquer maneira, crescemos, os Arreguys de Minas, sabendo que outros teriam vindo para o Brasil na mesma época, meados do século XIX, provavelmente um irmão de Joseph se fixando no Sul – Rio Grande do Sul? Argentina? Uruguai? Não temos certeza. De certo temos o grande escritor Mário Arregui, quase xará do meu irmão, artista plástico. Em comum entre todos até agora citados, o nariz marcante, o gosto pelas letras e pelas artes, a baixa estatura, a testa avantajada em sinal de inteligência.

Quando fui para a Europa para o desafio de pedalar o Caminho de Santiago de Compostela, em 2010, me preparei, junto ao grupo do qual faço parte, para começar a viagem antes de Saint Jean Pied-de-Port e curtir ao menos um pouco a paisagem do País Basco. Entramos de bicicleta por Mauleon, onde de cara adquirimos bandanas, lencinhos, bandeiras e outros souvenires com as cores e símbolos da nossa cultura de origem.

Placas com sinalização e palavras em basco eu já havia visto. Mas naquela travessia pude "estudar" até um pouco do intrigante idioma, que teria vindo diretamente dos antepassados. Donibani Garazi = Saint Jean Pied-de-Port. Claro! Como San Sebastian = Donostia! Evidente. Para os meus ouvidos e olhos chegados ao estudo dos idiomas, nada soava sem lógica. Eu sabia que estava em casa.

Em Saint Jean, indaguei sobre o sobrenome. Era conhecido do vendedor de uma loja. Que me disse haver um parente meu na farmácia. Corri atrás de um remedinho, enfrentei uma fila, pouco antes do fechamento das portas do estabelecimento, até chegar a minha vez e me informarem que o Arreguy trabalhava na outra farmácia, do outro lado da cidade.

O livro que comprei na cidade me contou tudo que havia a ser contado sobre o povo, a história, as origens, o país, a organização, a luta pela Independência. Adquiri também um dicionário de basco. Na volta da viagem, tentei parar em Bayonne, mas o tempo era apertado demais e tivemos que passar ao largo da cidade, à noite, por uma autoestrada. Não conheci a terra dos tataravós.


A viagem de bicicleta por Compostela me rendeu o romance "Siga as setas amarelas", que lancei no final de 2014 e que ainda estou divulgando em andanças pelo Brasil. Uma passagem do livro conta sobre essa travessia do País Basco, a visita às raízes familiares, algumas palavras de cumprimento na língua materna. Não fiz o mergulho na profundidade que o tema requeria. O desafio, naquele momento, era outro. Mas ainda reservo no coração espaço para o desejo de ir fundo nessa história. De Joseph e Catarina, João e Francisca, João e Glorinha, Nini e Maia, de quem trago essa bela herança.

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